24.2.07

Um sábado assim

Um sábado assim, perdido entre a folhagem tímida da Primavera que ainda não chegou mas já enviou convite. Um sábado assim, achado entre o espaço que medeia o meu corpo e o teu.
Um sábado assim é de memória. Já não me lembrava de como um dia que nunca vivêmos pode, afinal, ser tudo aquilo que a vida inteira imaginámos estar a viver. Um sábado assim não é prenúncio de nada e, contudo, consumação de tudo. É certeza de que há lugares longe que moram dentro de nós. E que estiveram sempre aqui, mesmo debaixo do nariz, tão perto como a brevíssima distância entre as letras do teu nome quando mordido pelo meu beijo.

© [m.m. botelho]

20.2.07

Saudades do futuro

© [m.m. botelho]
© [m.m. botelho] | fotografia | lisboa | agosto de 2006
antigo palácio dos condes de alvos [museu nacional de arte antiga]


Coisa curiosa esta, a de sentir saudades do futuro. Há [as tuas] palavras que me impregnam de coragem para que assim deseje. Este é o tempo das saudades de um futuro que eu ainda não sei o que guarda para mim, assim, tão secretamente. Será esse o tempo de percorrermos todos os lugares onde ainda não me levaste?

Que seja um futuro sem projectos, a acontecer a cada instante que passe e em cada lugar onde esteja, um pouco menos volátil do que um amontoado de sonhos que depressa se dissipam e se transformam em mágoas. Um futuro independente de ideais, que os de outrora todos falharam.

Tenho saudades do que serei, do que seremos por nós mesmos, amanhã.

© [m.m. botelho], ao som de Les Jours Tristes, de Yann Tiersen, na voz de Neil Hannon, do álbum L'Absente [2001].



It's hard, / hard not to sit on your hands, / burry your head in the sand, / hard not to make other plans / and claim that you've done all you can, / all alone / and life / must go on.
It's hard, / hard to stand up for what's right / and bring home the bacon each night, / hard not to break down and cry, / when every ideal that you tried / has been wrong. / But you must / carry on.
It's hard, / but you know it's worth the fight, / cause you know you've got the truth on your side, / when the accusations fly. / Hold tight! / Don't be afraid of what they'll say. / Who cares what cowards think, anyway? / They will understand one day, / one day.
It's hard, / hard when you're here all alone / and everyone else's gone home. / Harder to know right from wrong / when all objectivity's gone / and it's gone. / But you still / carry on.
'Cause you, / you are the only one left / and you've got to clean up this mess. / You know you'll end up like the rest / Bitter and twisted - unless / you stay strong / and you carry on.
It's hard, / but you know it's worth the fight, / 'cause you know you've got the truth on your side, / when the accusations fly. / Hold tight! / Don't be afraid of what they'll say. / Who cares what cowards think, anyway? / They will understand one day, / one day.

16.2.07

Velha

Sally Mann [n. 1951] | candy cigarette [1991]
Sally Mann [n. 1951] | fotografia | «candy cigarette» | 1991

Com o tempo, foi ganhando o hábito de não se emocionar com nada. Viveu sempre velha, muito velha. A pele lívida. Os olhos morrediços. O rosto seríceo. Por dentro, a alma encarquilhada. No peito, tantos anos depois, o coração ainda partido. Esmigalhado pelos dedos aduncos das horas.

© [m.m. botelho]

2.2.07

O que prometi

Qualquer dia, quando for capaz, faço o que prometi: deixo de te amar e passo o resto da vida a dobrar todas as esquinas o mais depressa que puder, fugindo de mim. Qualquer dia hei-de ser capaz e hei-de fazer o que prometi. Nem eu nem tu sabemos, ainda, de tudo quanto eu sou capaz.

«[...] when you're too in love to let it go,
but if you never try then you'll never know
just what you're worth [...]»

© [m.m. botelho] | excerto de Fix You, dos Coldplay, do álbum X&Y [2005].